O Grande Acelerador de Partículas (Large Hadron Collider,
LHC), representa um dado epistemológico muito importante. Para além daquilo que
possa vir a descobrir-se ou dos dividendos comerciais e/ou tecnológicos que os
países contribuintes possam vir a retirar (e que, à partida, se constituem como
condicionantes em projectos desta envergadura), o LHC apresenta-se como um
momento de possibilidade de viragem paradigmática: em primeiro lugar, porque se
trata não apenas de um projecto científico-tecnológico, mas de um projecto
cultural no sentido mais lato da palavra. E, em segundo lugar, porque se irá
dar primazia à chamada ciência “pura” ou ciência de base – algo que parecia
estar arredado da cena internacional.
O que tem
acontecido desde há muito, pelo menos em projectos que envolvam grandes montantes,
é uma certa subalternização da ciência de base pela investigação de cunho
tecnológico, por via da lógica de mercado e do investimento privado onde se
obedece à criação de receitas e a margens de lucro – principalmente se
estivermos a falar do campo das bio-tecnologias ou no campo das tecnologias de
informação e comunicação. A competição existente entre laboratórios ou entre empresas,
a necessidade de rentabilização dos investimentos, em detrimento da partilha e
da colaboração, tem vindo a criar uma espécie de paradoxo da informação, no que
diz respeito àquela de acentuado cariz científico-tecnológico. Quer dizer, ao
mesmo tempo que nunca existiu tanto volume de informação acerca do conhecimento
em geral, assim também se assiste a uma restrição da informação científica mais
particular ou específica. Quem já navegou à procura de informação aprofundada
sobre um determinado assunto científico, sobre assuntos mais específicos, certamente
se apercebeu do fenómeno de estrangulamento que a informação sofre a partir de
determinada altura. Em princípio seria espectável que, à medida que se
avançasse nas hiperligações gratuitas, estas fossem escasseando, mas
mesmo as não-gratuitas rarefazem-se no ciberespaço, atomizam-se e surgem quase
sempre truncadas ou muito fragmentadas. Como se no jogo da informação os
jogadores mostrassem apenas uma parte das peças, normalmente aquelas que todos
já têm, escondendo o que pensam faltar a cada um – é claro que, sendo a parada
demasiado elevada, ninguém se arrisca a abrir o “jogo”.
Metáforas à
parte, o que se tem assistido nas últimas décadas, especialmente em áreas que
envolvam o investimento privado, é a um fechamento, a um confinar de
horizontes, o que em última instância contribuirá sempre para a desaceleração
do conhecimento ou para sua pouca expansão, por mais meios de difusão da informação que tenhamos ao dispor.
Ora, projectos como o LHC
representam precisamente uma ruptura com este estado de coisas, pois a sua
natureza implica necessariamente a partilha e a construção colectiva do
conhecimento – quer pelo número de países envolvidos, quer pelas competências
exigidas – algo em que, geralmente, a área da Física é pioneira e que devia ser
imitado por outras áreas do conhecimento humano.